Luís H. Marcos e Ana Melro: Precária mas essencial para a democracia

Luís H. Marcos e Ana Melro: Precária mas essencial para a democracia

Assiste-se a um momento de grande convulsão no ecossistema mediático em geral, com grave incidência em Portugal. Neste cenário, com base num estudo exploratório, a presente comunicação confirma o estado de apreensão e as baixas expectativas dos jornalistas (N = 96) relativamente às condições de trabalho no futuro. Apesar disso, os resultados mostram que 96% dos jornalistas inquiridos consideram a profissão “essencial para a manutenção da democracia”.

1 – PANORAMA DO SETOR

Vive-se hoje o estado mais crítico da profissão de jornalista das últimas décadas. 

Passado o período da COVID-19, em que a profissão foi um sustentáculo especial, assiste-se a uma crise grave no setor. 

Um estudo da ERC mostra mais prejuízos de 2021 para 2022 em alguns grupos. Em particular, a Global Media com dois milhões €, acumulados desde 2014. Detentor do DN, JN, O Jogo, Açoriano Oriental e TSF, o grupo anunciou 200 despedimentos.

A empresa de A Bola (Vicra Desportiva) tem resultado negativo (270.000 €) e quer despedir 100. No Público e no Observador, a situação agravou-se de 2021 para 2022. Melhor continua a COFINA (Correio da Manhã, CMTV, Record, Negócios, Flash e TV Guia) com um saldo positivo. 

Estáveis: IMPRESA (SIC e Expresso), RTP, RR e Trust News (Visão, Caras, Ativa e TV Mais).

O estudo releva a Media Capital (TVI e CNN) que lidera prejuízos nos últimos nove anos, com um défice de 4,5 milhões (1º semestre 2023) 1; e o grupo Bauer Media (rádios Comercial, M80, Cidade FM, Batida FM e Smooth FM que teve um lucro superior a 4,7 milhões €. 

Apesar deste panorama, a evolução é positiva nas redações em termos académicos. Radiografia da CCPJ 2 : mais de 75% dos jornalistas têm cursos superiores (com 61 doutores!); apenas 26 têm o Ensino Básico e 1282 o ‘Secundário’.

Embora a profissão continue a ser mais masculina (58%, homens), regista-se que, até aos 40 anos, é mais feminina. A situação inverte-se seguir.

Em termos de setor, a imprensa absorve mais jornalistas (2108), seguida da TV 961), Rádio (504), Multimédia (367) e Agências (285).

 

  1. CONDIÇÕES EM 2050 

Esta comunicação baseia-se no estudo “Horizonte 2050”, com 96 jornalistas inquiridos a nível nacional. 

Questionados sobre caraterísticas do perfil do jornalista, os inquiridos valorizam cinco no presente: ética, rigor, competências de escrita, capacidade crítica e imparcialidade. Estas são também as mais indicadas no futuro, trocando “imparcialidade” por “competências de pesquisa”. 

Sobre competências digitais, 84% consideram que elas são importantes no perfil do presente, subindo para 90% no futuro. 

Em termos laborais, os jornalistas dizem estar mais satisfeitos com o trabalho em equipa (53%) e com as hierarquias (49%).  Insatisfatória é a oferta de formação especializada (62%), a remuneração salarial (51%) e a oferta de espaços de lazer nas redações (45%). Para 92% o jornalista tem “uma profissão precária” e quase metade (49%) não acredita vir a ter “melhores condições de trabalho”. 

Outros aspetos destacados: o jornalista precisa “de formação constante” (86%); tem “uma profissão em constante mutação” (85%); e sente-se “pressionado para publicar imediatamente uma matéria por questões de concorrência” (82%). Sobre o futuro, mais de metade (51%) não tem opinião formada sobre se o jornalista “vai demonstrar mais credibilidade no que escreve/diz”. Concordam, todavia, que despenderão mais tempo na “produção de informação de qualidade” (43%) e na “verificação de informação” (51%).

Sobre o papel da Inteligência Artificial no futuro, há divergências: para 32%, o jornalista “terá o trabalho mais facilitado”; e para mais de metade (52%) “terá mais dificuldades de emprego”.

Sobre a valorização atual da profissão, a grande maioria (79%) discorda da importância atribuída pela sociedade e acredita numa melhoria futura. A quase totalidade (96%) acha que o jornalista tem “uma profissão essencial na manutenção da democracia”.